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Homero - Mistério, Guerra, Deuses e Heróis

Atualizado: 4 de ago.



Na postagem O que é história? descrevi como é o trabalho do historiador, o profissional que analisa, interpreta e pesquisa o passado por meio da análise de documentos históricos. Falei também sobre as ciências auxiliares da história, como a arqueologia, a antropologia, a etnografia e a astronomia. O historiador tem à disposição uma série de documentos e ciências auxiliares para a reconstrução do passado. Apesar disso, muitas vezes a precisão histórica não é conseguida. Por vários motivos.


Quem foi Homero? Ele Realmente Existiu?


Homero foi um aedo, ou seja, um cantor de poesia épica da Grécia Antiga, a quem se atribui a autoria da Ilíada e da Odisseia, duas obras fundamentais da tradição greco-romana e, portanto, também da tradição ocidental.


Apesar da sua enorme importância, pouco se sabe sobre ele e muito do que se sabe pertence ao campo das lendas. Provavelmente ele nasceu, viveu e morreu em algum momento do século VIII a.C., bem antes do Período Clássico (de 500 a.C. a 323 a.C.) da Grécia Antiga.


Análises minuciosas realizadas nos textos das duas obras, levantam a dúvida se Homero realmente existiu. Há os que afirmam tratar-se de uma espécie de pseudônimo sob o qual se escondem vários autores desconhecidos.


Para alguns, ele foi descendente de Orfeu, um músico, poeta e profeta lendário na religião grega antiga, outros ainda afirmam que ele foi um cantor cego que vagou de cidade em cidade. Para alguns comentaristas, sua biografia poderia ser reconstruída a partir do significado de seu nome, “refém”, em grego.


Existem também opiniões contraditórias quanto ao local onde viveu: há quem acredite que ele viveu no século VIII a.C., há quem remonte a sua existência ao período da Guerra de Troia e quem afirme que ele viveu cerca de duas décadas depois desse evento. Mesmo seguindo indícios e suposições, não é possível ter certeza de nada.


Textos históricos posteriores à sua época nos dão indicações sobre suas origens, mas em alguns casos os próprios textos se contradizem. Por causa disso, a maioria das biografias de Homero em circulação não contém dados confiáveis ​​sobre o poeta. Com base nas características linguísticas das suas obras, historiadores atuais confirmam que ele nasceu na área colonial jónica da Ásia Menor.



Na Antiguidade, ele foi frequentemente considerado “divino”, imaginado cego e diretamente inspirado pelas musas. Estátuas foram erguidas e santuários foram construídos em sua homenagem. Mas, quem realmente foi Homero? Ele existiu? Se existiu, escreveu os dois poemas? E se ele não existiu, quem os escreveu?


Onde Nasceu Homero?


Os estudiosos atuais consideram altamente provável que os poemas homéricos realmente tenham se originado nas regiões da ilha de Chios, no Egeu, ou de Esmirna, na costa oeste da Turquia. O seu grego, embora nunca tenha sido falado, é em geral mais típico dos antigos dialetos da costa oeste da Turquia e das ilhas próximas à costa do que dos dialetos da Grécia continental.


No século VI a.C., vários escritores descreveram um talentoso poeta de Chios, onde existiu um grupo de bardos performáticos que se autodenominavam 'Homeridae' ou 'filhos de Homero'.  Existem referências nas primeiras fontes de Homero sendo concebido na ilha de Ios ou em Cyme e nascendo em Esmirna.


O dialeto em que a Ilíada e a Odisseia foram escritas é considerado grego asiático, especificamente jônico. Isso, mais as menções frequentes a fenômenos locais, como ventos fortes soprando do noroeste na direção da Trácia, sugere, segundo os estudiosos, uma familiaridade com aquela região que só poderia significar que Homero veio de lá. 


O dialeto coincide com o desenvolvimento e o uso da linguagem em geral, mas a Ilíada e a Odisseia eram tão populares que esse dialeto em particular se tornou a norma para grande parte da literatura grega posterior.


Quando Nasceu Homero?


A julgar pelas primeiras referências à sua obra, que datam pelo menos do século VII a.C., é possível que tenha nascido em algum momento do século VIII a.C. ou mesmo IX a.C. As suposições sobre a data de seu nascimento variam de 750 a.C. até 1.200 a.C., esta última porque a Ilíada abrange a história da Guerra de Troia. Alguns estudiosos consideraram adequado colocar o poeta e cronista mais próximo da época real do evento. Outros acreditam que o estilo poético de sua obra indica um período bem posterior.

O historiador grego Heródoto (c. a.C. 484-425 a.C.), colocou Homero, por volta de 850 a.C. Parte do problema é que ele viveu antes de existir um sistema de datação cronológica. Os Jogos Olímpicos da Grécia clássica marcaram uma época, 776 a.C. como ponto de partida para medir períodos de quatro anos para o evento. É difícil determinar uma data de nascimento antes de existir um calendário.



Para Heródoto de Halicarnasso (484-425 a.C.), Homero devia ter vivido pouco depois da Guerra de Troia, que deve ter ocorrido por volta do século IX a.C. Já para Heráclito de Éfeso (c. 540-c.480 a.C.) Homero havia morrido de amargura por não conseguir resolver um enigma formulado por uma criança.


Muitas dessas fábulas e suposições foram incorporadas em diferentes pseudo biografias do bardo, escritas ao longo dos séculos III e II a.C. que, por sua vez, foram assimiladas e refinadas pelos literatos do Império Romano. Bardo, ou aedo, na Europa Antiga, era uma pessoa encarregada de transmitir histórias, mitos, lendas e poemas de forma oral, cantando as histórias do seu povo em poemas recitados. Era simultaneamente músico, poeta e historiador.


A Aparência de Homero


Em grego, a palavra homeros, como já dissemos, poderia significar 'refém' . Por isso, alguns imaginaram que ele era um cativo. Mas também poderia significar cego. Acredita-se que ele era cego, com base apenas em um personagem da Odisseia, Demodokos um poeta/menestrel cego.


Uma longa dissertação sobre como Demodokos foi recebido em uma reunião e presenteou o público com música e contos épicos de conflitos e heróis foi interpretada como uma dica de Homero sobre como era sua própria vida. Daí, foram esculpidos muitos bustos e estátuas suas com olhos cegos, cabelos e barba crespos e grossos.


É possível que essa cegueira tenha sido um mito inventado para explicar o fato de que os poemas homéricos evoluíram originalmente de forma oral, antes do desenvolvimento da escrita na Grécia, sendo executados e transmitidos de bardo para bardo. Como o poeta cego Demódoco na Odisseia, um bardo teria cantado os poemas diante de uma audiência, repetindo passagens e frases definidas, como "Odisseu divino", para satisfazer a métrica poética.


A Infindável Questão Homérica


Homero é um mistério. Ele realmente viveu ou é um personagem completamente inventado? O poeta épico grego é um enigma no que diz respeito aos fatos de sua vida. Alguns estudiosos acreditam que ele foi um só homem; outros acham que, devido ao fato de que  contar histórias era uma tradição oral, essas histórias icônicas foram criadas por um grupo e não por um único autor. Ele compilava as histórias e depois as recitava de memória. Toda essa especulação sobre quem ele era levou inevitavelmente ao que é conhecido como a Questão Homérica, considerado, com frequência, o maior mistério literário.



Iniciado na Antiguidade e ainda inacabado, é um dos debates mais antigos da história. Diferentes estudiosos dos séculos XVIII e XIX como François Hédelin, Giambattista Vico, Friedrich August Wolf, Adolf Kirchhoff, Ulrich von Wilamowitz-Moellendorff e muitos outros, fizeram dessa questão a sua principal preocupação acadêmica.


A figura de Homero é, portanto, uma combinação de realidade e lenda. Ele geralmente é descrito como um poeta cego que em algum momento do século VIII a.C. começou a viajar pelo mundo helênico. Em suas viagens, recitava seus poemas épicos para quem quisesse ouvir. Seus espectadores eram tanto plebeus quanto nobres.


Fontes antigas reconstruíram sete biografias escritas por diferentes autores e intituladas Vidas de Homero. As duas biografias mais conhecidas são as atribuídas a Heródoto, a Plutarco ou provavelmente Hesíodo.


Quem, Afinal, Escreveu a Ilíada e a Odisseia?


Homero é considerado o maior poeta da cultura ocidental. Mas será que ele realmente escreveu a Ilíada e a Odisseia? Na verdade, os poemas não são obra de um gênio isolado, mas o ponto final de uma longa tradição oral de poesia épica. Na Ilíada, poema de guerra, é narrada parte dos acontecimentos de Aquiles no cerco de Troia.


Na Odisseia, um poema sobre a viagem, o retorno de Odisseu à sua terra natal, Ítaca, e sua vingança contra os nobres que ameaçaram sua esposa Penélope. O mundo de Homero é complexo e variado, pois mistura elementos mais antigos com outros da 'Idade Média Helênica', época em que os poemas foram compostos.


Com base em certas diferenças perceptíveis no uso da linguagem nos dois poemas, filólogos como Friedrich August Wolf (1759-1824) sugeriram a possibilidade de cada texto ter um autor diferente. Se assim for, poderia na verdade ser um coletivo e não um único autor.


O poeta lírico Píndaro (c. 518-438 a.C.) contou a existência dos homeridai (filhos de Homero, em grego), antigo clã jônico formado pelos descendentes de Homero e responsável pela popularização de suas obras no resto da Grécia.


Se acrescentarmos a isso que a palavra homeros poderia ser uma distorção da palavra jônica homaros, traduzível como “refém”, pode ser que esses homeridai fossem na verdade um grupo de prisioneiros de guerra, muito velhos ou aleijados (cegos, por exemplo) que trabalhavam como recitadores de poesia épica local.

Luciano de Samósata (125-181 d.C.) afirmou que Homero era um refém babilônico feito pela Grécia, daí seu nome.


Homero era um homem? Era um grupo ou linhagem de poetas? Era uma mulher? Samuel Butler, romancista do final do século XIX, estava convencido de que a autora da Odisseia, era uma mulher. Porém, para a maioria das pessoas da Antiguidade os dois épicos foram produtos de uma única mente, masculina.


Para uma tentativa de responder essas questões, os estudiosos foram divididos em dois campos. Um deles acredita que os poemas foram escritos por múltiplos autores, pela extensão, pelos anacronismos e pelo uso de diferentes técnicas literárias e das variantes da língua grega presentes nas duas obras. O outro grupo defende que o autor assumiu a responsabilidade de criar a obra depois de ter recolhido e sintetizado histórias orais.



Como os dois trabalhos foram desenvolvidos? Existe maior consenso entre os investigadores que concordam com o fato de que os textos, sejam eles da obra de um único autor ou de uma comunidade, são o resultado de uma compilação de composições orais populares da época. Composições transmitidas de geração em geração e escritas na Ilíada e na Odisseia sob o nome de Homero.


Após a queda do Império Romano, a maioria dos textos escritos foi perdida. Durante a Idade Média, os mosteiros eram responsáveis ​​pela tradução e cópia dos textos greco-latinos. Estima-se que existiram pelo menos 800 autores na Roma Antiga, mas conhecemos apenas 140. A tarefa de traçar e delinear as obras e autores da Antiguidade é extremamente difícil. Além disso, é trabalhoso determinar a autoria de muitas obras famosas. O autor Aristarco de Samotrácia, acredita que Homero escreveu a Ilíada quando jovem e a Odisseia na velhice.


Os estudiosos contemporâneos, geralmente, concordam que as duas obras foram fruto de uma longa tradição de narrativas orais, transmitidas popularmente de geração em geração. Isso, porém, não nega que foi Homero quem lhes deu a forma, a estrutura e a composição mais reconhecidas, que serviram de base às transcrições e traduções que surgiram ao longo dos séculos.


Embora, desde a Antiguidade, a grande contribuição de Homero para dar forma e estrutura a essas histórias diversas e tradicionais tenha sido reconhecida, ainda permanece a questão sobre como foram transcritas e quem cunhou a versão “definitiva” e com que critérios de autoridade.


Segundo muitos historiadores e escritores, Homero foi o primeiro a abrir as portas da criação literária no Ocidente. Além disso, revelou a mitologia grega e é graças a ele que podemos ter uma ideia da sociedade grega da época em que viveu. Quando falamos de Homero, referimo-nos ao nascimento da literatura ocidental, fonte histórica e etnográfica, exemplo a seguir, como grande sábio da sua época.


O debate voltou a ficar mais acirrado no século XVIII quando um escritor francês, François Hédelin (abade D'Aubignac) e o filósofo italiano Giambattista Vico, de forma independente, chegam a formular uma hipótese radical: os dois poemas são fruto do longo trabalho de cantores gregos anônimos e não de um gênio isolado. Homero, portanto, nunca teria existido.


Entre o final do século XIX e início do XX, uma série de estudiosos passou a evidenciar diferenças linguísticas entre as diversas partes, inconsistências do ponto de vista de uso e conteúdo, contradições na narração dos fatos e atribuições de autoria dos poemas a vários autores.


Homero, então, torna-se apenas o último ou mais importante poeta que deu um arranjo definitivo ao material de outros poetas. Mas, mesmo neste período, não faltam estudiosos que vejam um verdadeiro Homero como autor dos dois poemas, sublinhando neles correspondências internas e arquiteturas composicionais refinadas que só podem ser fruto de uma obra literária unitária.

 

Muitos Autores, Nenhuma Certeza


Em 1928, um jovem estudioso americano, Milman Parry, inicia pesquisas na Península Balcânica, entre os cantores sérvios e croatas e descobre uma extraordinária série de analogias entre os textos homéricos e as canções daqueles povos. Canções decoradas por poetas itinerantes que, muitas vezes nem sabiam escrever, tratam de temas e motivos de guerra e aventura. Nelas se repetem cenas típicas como o duelo ou o sacrifício aos deuses, muitas vezes descritas com as mesmas palavras dos poemas homéricos.


Por fim, elemento determinante, há o uso constante de expressões fixas para indicar personagens e momentos típicos, principalmente no final das linhas. Essas expressões não são funcionais ao contexto (os navios são sempre "rápidos" mesmo quando estão ancorados no porto), mas servem ao poeta para concluir o verso de forma simples e, acima de tudo, representam uma ajuda muito importante para a memorização das canções. São verdadeiras fórmulas.


A hipótese de Parry é, portanto, a de que os poemas homéricos são o que resta da tradição da poesia grega composta oralmente e recitada para um público de ouvintes nas cortes das aristocracias arcaicas ou nas festas da cidade, tal como cenas descritas na Ilíada e na Odisseia.


A teoria da oralidade resolve, em grande parte, a questão homérica tal como foi colocada anteriormente. Homero não pode mais ser considerado o autor dos dois poemas, que constituem o ponto de chegada de uma longa e anônima tradição oral de aedos, escrita apenas a partir do século VI a.C. Entretanto, permanece o mistério e, ao mesmo tempo, o encanto de duas obras extraordinárias que parecem tão intimamente equilibradas que por vezes fazem realmente pensar numa criação inspirada.


A palavra aedo vem do grego aoidós, que significa “cantor”. Era usada na Grécia Antiga para nomear uma profissão semelhante à dos bardos medievais, artistas itinerantes que recitavam as grandes épicas mitológicas da tradição local, acompanhados por um típico instrumento de cordas denominado cítara. Homero foi o mais importante e mais conhecido dos antigos aedos.



Isso significa que tanto a Ilíada como a Odisseia, obras particularmente volumosas, foram compostas para recitação oral, ou seja, sem o apoio da escrita. Por isso são estruturadas em versos, porque a rima evoca mais facilmente os versos seguintes na memória do poeta. Isso também levanta a questão de quando e como foi transcrito ou gravado por escrito pela primeira vez.


Os aedos cantavam para a aristocracia, em suas cortes ou banquetes, ou também em reuniões e eventos da polis. Suas canções consistiam em poemas curtos que relatam uma anedota ou episódio específico, como é o caso dos Hinos Homéricos dedicados a um deus ou a uma personalidade mitológica específica. Ou canções maiores, extensas demais para serem recitadas em um único dia, como provavelmente foi o caso da Ilíada.


Muito do que se sabe sobre a vida dos aedos, paradoxalmente, é conhecido graças a Homero. Em suas obras (especialmente na Odisseia) a profissão é destacada por meio dos personagens de Demódoco, aedo da corte do rei Alcinous , e Phemius, aedo da corte de Ítaca. Quanto mais emocionados ficassem com seu canto, maior seria a recompensa recebida pelo aedo.


Alguns de seus biógrafos antigos afirmam que Homero construiu o personagem Phemius a partir do aedo real que lhe ensinou o ofício e que também era marido de sua mãe. Supostamente, após a morte do padrasto, Homero dedicou-se ao ofício à frente de uma escola de aedos, antes de ficar cego devido a alguma doença.


Os termos aedo e rapsodo não devem ser confundidos, embora ambos sejam de origem grega antiga e se refiram a um tipo de recitador popular. Os aedos recitavam suas próprias composições, acompanhando-se com instrumentos musicais, enquanto os rapsodos memorizavam as composições existentes e as recitavam com o auxílio de uma bengala para marcar o ritmo, batendo no chão.


O Nascimento do Poema Épico


Na Grécia, há muitos séculos, os nobres estão reunidos para um banquete em volta da lareira. Junto com eles sentam-se amigos e convidados, mas também um cantor: o bardo. Acompanhado pela cítara, ele começa a narrar feitos de reis e heróis, guerras e viagens. O bardo, que é cantor e poeta, escolhe histórias do vasto repertório de mitos que a tradição lhe deu, transmitindo de pai para filho a memória de um passado lendário. Assim nasce a epopeia.


Os poemas homéricos, na Ilíada e na Odisseia, descrevem cenas em que os bardos animam as cortes aristocráticas com o seu canto.  Ao sublinhar os princípios do mundo heroico, da lealdade, da virtude e da astúcia, a epopeia indica os valores que a sociedade deve inspirar. Por meio da narração de acontecimentos míticos, ela constrói uma ponte ideal entre aqueles heróis antigos e as poderosas famílias aristocráticas da Grécia arcaica. A descrição das batalhas, façanhas e aventuras dos seus protagonistas quer ensinar a todos a arte da guerra, mas também como construir um navio ou como preparar um sacrifício.


A epopeia diz respeito a tudo e a todos. Por essa razão foi definida como uma “enciclopédia tribal” ou um “livro de cultura”. Neste sentido, os poemas homéricos são para os gregos antigos o que a Bíblia é para o povo judeu. Para a poesia grega subsequente e depois para grande parte da literatura europeia, a Ilíada e a Odisseia serão sempre o modelo presente, o ponto de referência para todos, do cidadão ao sacerdote.


Obras de Homero


A importância da obra de Homero foi bem compreendida pelos seus herdeiros, que encontraram nela a fonte de inspiração para as grandes peças do teatro clássico grego e uma fonte de histórias mitológicas para a formação da cidadania.

Os épicos homéricos estão entre as obras literárias mais antigas e populares que sobreviveram. Inicialmente compostas para serem cantadas, a sua relevância transcende o contexto da cultura grega antiga, pois também fizeram parte do patrimônio cultural do Império Romano e, portanto, do mundo cristão e do imaginário do Renascimento. Ambas as obras foram apreciadas, traduzidas e estudadas ao longo de quase três mil anos de história, o que faz de Homero um dos maiores autores da humanidade.


De qualquer forma, sua obra desempenhou um papel fundamental na tradição greco-romana, considerada o berço artístico, moral e literário do Ocidente. Elas continuam a ser editadas, lidas e estudadas, e inspiraram o trabalho de centenas de artistas de diferentes culturas e gêneros expressivos.


A Ilíada


A Ilíada recebe o título do nome Ilion, que os gregos deram à cidade de Troia. É um longo poema épico de 15.693 versos organizado em 24 canções diferentes, ao longo das quais é contado o que aconteceu durante os cinquenta e um dias do último ano da Guerra de Troia. Especialmente relacionado com Aquiles, um dos maiores heróis da antiga tradição grega.


No conflito, se confrontam o exército invasor grego, as resistentes tropas troianas e os próprios deuses do Olimpo que se colocam em lados opostos. Na luta dos humanos, os deuses viram a oportunidade de resolver suas próprias disputas, proteger seus heróis favoritos e punir aqueles que os desrespeitassem.


A Odisseia


É um poema épico de 24 canções, precursor de todos os romances de aventura que foram escritos na história. A Odisseia narra as desventuras de Odisseu, rei de Ítaca (batizado de Ulisses pelos romanos), em sua longa viagem de volta para casa.

A trama começa quando a guerra termina e as forças troianas são derrotadas.


Quando Odisseu e sua tripulação empreendem o difícil retorno de barco e sofrem todo tipo de calamidades. Ao longo de dez anos de aventuras e perdas, Odisseu luta para retornar à sua rainha, Penélope, que mal resiste ao cerco de seus pretendentes, que consideram o rei morto e aspiram ao trono.




Os Hinos Homéricos


Os Hinos Homéricos recebem esse nome porque na Antiguidade eram atribuídos a Homero (ou, segundo outras opiniões, aos homeridai). É um conjunto de 32 a 34 poemas épicos curtos, muito diferentes entre si, nos quais é contada a história dos principais deuses do Olimpo e de outras personalidades importantes da mitologia grega.


Esses hinos deveriam ser recitados pelo aedos como um prelúdio (proêmio), para um poema épico mais longo. Alguns têm poucos versos, outros chegam a quinhentos, mas são compostos no mesmo estilo métrico das demais peças de Homero. Segundo Hesíodo, são os textos mais antigos da literatura grega.


Reduzir a obra de Homero apenas à Ilíada e à Odisseia seria minimizar a sua produção. Hoje em dia, outras obras lhe são atribuídas. Por exemplo, o épico cômico menor chamado: Batracomiomachia (A luta entre sapos e ratos). Além disso, acredita-se que ele tenha escrito outros fragmentos literários, como o Margite.


Realidade Histórica, Deuses e Heróis


Nos poemas homéricos, as diferentes realidades históricas no decorrer das quais foram desenvolvidos se sobrepõem. Em particular, identificam-se dois mundos, muitas vezes justapostos: o da civilização micênica e o da chamada Idade Média Helénica. O primeiro constitui o pano de fundo heroico em que se situam historicamente as façanhas da Guerra de Troia e os “regressos” dos gregos à sua pátria (séculos XIII a.C.-XII a.C.); o segundo é a fase mais recente em que os poemas assumiram a sua forma mais ou menos definitiva (séculos IX a.C.-VIII a.C.).


Por exemplo, o uso da luta com uma carruagem, o uso de armas de bronze e escudos ou capacetes específicos, e o título de rei atribuído aos heróis são de origem micênica muito antiga. Contudo, a descrição da maior parte das formas sociais e políticas - como as assembleias ou a servidão familiar - e, sobretudo, de todas as cenas nele contidas, verdadeiro reservatório de informações sobre a época mais arcaica e, para nós sombria, dos gregos.


Até as concepções religiosas e o caráter dos protagonistas são afetados pela longa e diferenciada elaboração dos poemas. Os deuses são representados tanto como soberanos absolutos dos destinos humanos quanto como seres briguentos, mas sempre sujeitos a um destino superior e imutável. Não há solução para o problema da relação entre Deus e o homem, que é feita de distância, de amor e inveja. Só na Odisseia o indivíduo parece ser capaz de ter um impacto mais decisivo no seu próprio destino.


O caráter dos personagens principais é fixado pelo mito, e não é delineado de forma particular. Não há intenção de descrever a psicologia ou o mundo interior dos heróis, que agem ora por impulso, ora por dever, outras vezes consciente do próprio destino já selado.


Na Ilíada, o amor está quase ausente e há poucas figuras femininas. Diferentemente acontece na Odisseia, onde a mulher transita naquela área de afetos e sentimentos mais marcantes que é negada aos personagens masculinos.


A Morte e o Sepultamento de Homero


Assim como os detalhes da vida de Homero são desconhecidos, as condições exatas de sua morte também o são. Porém, há maior grau de concordância entre os especialistas: Homero morreu e foi sepultado na ilha grega de Ios, no arquipélago das Cíclades, no Mar Egeu. Porém, existem diferentes histórias sobre as condições de sua morte.


A história tradicional afirma que, quando jovem, ele consultou o oráculo e a morte foi prevista para ele. Seria em uma ilha e seguindo um enigma. Anos mais tarde, Homero conheceu um grupo de crianças acadianas que voltavam da pesca e perguntou-lhes como tinha sido o trabalho. As crianças, querendo zombar do velho, responderam-lhe com uma charada: “Aqueles de nós que pescamos jogamos fora; Aqueles que não o fizeram, nós trouxemos para casa”, referindo-se aos piolhos em suas cabeças. Existem três versões do que aconteceu:


Na versão mais difundida, Homero não conseguiu compreender o enigma, sentiu o cumprimento de sua profecia e a morte iminente e mergulhou na depressão. Aos poucos, ele parou de comer, adoeceu e no final a profecia se cumpriu.


Outra versão afirma que Homero chegou a Ios já muito doente, num navio que encalhou na costa. Lá conheceu as crianças e recebeu o enigma, que, imediatamente, entendeu como o sinal de sua morte iminente.


A terceira versão conta que Homero chegou a Ios, onde recebeu a charada dos filhos dos pescadores e, obcecado em respondê-la e escapar de sua profecia juvenil, caminhou distraidamente, escorregou e bateu a cabeça nas pedras.


Ao longo dos séculos, surgiram várias lendas sobre a descoberta da tumba de Homero. Antigamente afirmava-se que tinha sido encontrada nas proximidades de Plakoto, enquanto no século XVIII o explorador holandês Pasch van Krienen afirmou tê-la encontrado noutra região da ilha e ter levado a louça de barro com o epitáfio para a Cidade italiana de Livorno, onde desapareceu misteriosamente.


A Contribuição de Homero Para a Cultura Ocidental


Apesar de todos esses debates, não podemos negar que Homero e as suas obras são os pilares da literatura ocidental. Qualquer pessoa que estude literatura ou história da arte sabe que Homero é o primeiro nome do cânone literário. Ele foi muitas vezes um ponto de referência na Antiguidade, por isso a Eneida (o grande épico sobre o Império Romano, escrito por Virgílio) é uma espécie de reescrita de suas obras.


Existem poucas disciplinas humanísticas que escapam ao trabalho de Homero. Da literatura à filosofia, passando pela arqueologia e pela história, ele é citado por todos como fonte de inspiração ou como referência histórica para o estudo da Grécia Antiga.


Podemos dizer que Homero moldou a sociedade grega no final da era arcaica (século VIII a.C.). Uma sociedade baseada na guerra, onde existia a escravidão e os sacrifícios aos deuses. Também descreve tribunais de justiça e uma sociedade com certos valores éticos fundamentais em relação às mulheres, aos idosos, aos mendigos e aos cadáveres dos inimigos.


Concluindo, estamos diante de um autor que conseguiu sobreviver ao tempo. Um autor cuja leitura continua fundamental, nas salas de aula ou fora delas. Homero, qualquer que seja a sua identidade, ou mesmo se ele tenha existido, será sempre o grande poeta épico da Antiguidade.

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